STF decide que não há prazo para cobrança na Justiça de dinheiro público desviado de forma dolosa

Por maioria de 6 votos a 5, os ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiram nesta quarta-feira (8) que ações de ressarcimento aos cofres públicos contra agentes que cometam ato de improbidade administrativa não prescrevem, desde que o ato praticado seja doloso – ou seja, cometido de forma intencional.

Com a decisão, a ação de ressarcimento pode ser apresentada a qualquer tempo, independentemente da data em que o fato ocorreu.

Como votaram os ministros

Contra a prescrição A favor da prescrição
Edson Fachin Alexandre de Moraes
Rosa Weber Dias Toffoli
Luís Roberto Barroso Ricardo Lewandowski
Luiz Fux Gilmar Mendes
Celso de Mello Marco Aurélio Mello
Cármen Lúcia

Inicialmente, Fux e Barroso haviam se posicionado pela prescrição. Durante o debate, porém, mudaram de ideia e votaram contra o prazo.

O julgamento teve início na semana passada, com o voto de oito ministros, mas foi suspenso e retomado nesta quarta. Antes do reinício da análise, o Supremo havia formado maioria para estabelecer um prazo para a ação. Nesta quarta, porém, os demais ministros formaram maioria definitiva contra a prescrição.

A decisão tem repercussão geral, ou seja, valerá para todos os casos semelhantes nas instâncias inferiores. Segundo o STF, mil casos nas instâncias inferiores tratam sobre a prescrição de casos de improbidade.

Após o julgamento, a procuradora-geral da República afirmou que a decisão “evita retrocesso na defesa do patrimônio público, garante a segurança jurídica e a integridade no uso da coisa pública”.

O que é improbidade; o que é prescrição

  • Improbidade administrativa: É uma irregularidade – e não um crime – cometido por um agente que tenha o controle de recursos ou bens públicos. Uma ação desse tipo, na área cível da Justiça, pode levar a punições como multas e devolução de valores. O condenado também pode ter direitos políticos suspensos e ficar inelegível se confirmado que houve enriquecimento ilícito. Atos que se enquadram como improbidade também podem ser considerados crimes – nesse caso, as regras de prescrição estão mantidas como previsto na lei penal. A pessoa pode responder pelo mesmo ato em ação de improbidade e em ação penal.
  • Prescrição: A prescrição é a perda do direito do estado de punir o cidadão, nesse caso, servidores públicos, por não cumprir o prazo previsto em lei para questionar a irregularidade.

Caso julgado

O caso discutido pelo Supremo aconteceu em São Paulo. O Ministério Público paulista recorreu contra uma decisão do Tribunal de Justiça (TJ-SP) que entendeu que houve prescrição no caso de ex-servidores acusados de participar de uma licitação de dois veículos com preços abaixo do mercado.

Segundo o TJ-SP, a Lei de Improbidade Administrativa diz que a ação disciplinar prescreve em cinco anos em caso de infração punível com demissão. Esse prazo é contado a partir do momento em que o fato é descoberto.

A Procuradoria Geral da República defendeu o pedido em parte, para que o Ministério Público pudesse, a qualquer tempo, requerer o ressarcimento ao erário de agentes públicos por meio de ações civis públicas.

Em nota técnica divulgada nesta quarta antes do julgamento, a Procuradoria Geral da República criticou o estabelecimento do prazo.

“É inegociável porque o ilícito não pode gerar proveito indevido, direto ou indireto, que fique imune ao confisco, nem ser perdoado sem depuração do prejuízo causado à administração pública, isto é, à sociedade como um todo”, diz a nota.

Mudança de votos

Inicialmente, a análise do caso resultou em 7 votos a 4 pela prescrição dos atos de improbidade. Antes da proclamação do resultado, porém, os ministros Luiz Fux e Luis Roberto Barroso pediram a palavra e mudaram seus votos, alterando o placar para 6 votos a 5 contra a prescrição.

Ao retificar o voto, Fux disse que não considerava “consoante com os princípios e a postura do STF” que atos de improbidade administrativa ficassem “imunes à obrigação do ressarcimento”.

“Então, com toda humildade, peço vênia para retificar meu voto, e estabelecer que entendo imprescritíveis as ações de ressarcimento por danos causados por crimes praticados por servidores e agentes públicos em geral e por atos de improbidade”, afirmou o ministro.

Após muita discussão, Barroso também mudou o voto, argumentando que recebeu elementos retratando que o impacto da prescritibilidade traria no enfrentamento da corrupção e de atos de improbidade.

“Tendo levado em conta os argumentos jurídicos, muitos argumentos que me foram trazidos, sobre as dificuldades, quando não impossibilidade de recuperação, muitas vezes de dinheiros desviados, em que há uma delonga administrativa e no processo penal, eu me convenço que como regra geral, a prescritibilidade, neste caso, não produz o melhor resultado para a sociedade”, afirmou.

Barroso defendeu que a imprescritibilidade, no entanto, seja aplicada somente em casos em que a improbidade é “dolosa”, ou seja, em que houve vontade do agente em cometer o ato. Essa posição foi seguida pelos demais ministros.

O ministro Alexandre de Moraes criticou o entendimento formado pela maioria do Supremo e disse que o que atrapalha o Estado a recuperar dinheiro desviado é a “incompetência”.

“Queria rechaçar o que, para mim, é uma falácia dita por vários membros do Ministério Público, de que a prescritibilidade atrapalharia o enfrentamento da corrupção. O que atrapalha é a incompetência. Alguém que seja órgão da administração pública ou do Ministério Público, que têm ciência do fato, tem cinco anos para fazer algo, se nesse prazo não conseguiu o mínimo para ingressar com a ação, ou é porque nada há ou é porque é incompetente”, defendeu Moraes.

Gilmar Mendes também foi contra o entendimento. “Amanhã poderemos estar aposentados ou mortos e virão ações. É um convite para não exercício de função pública”, afirmou.

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