Uma mudança anunciada pela Caixa Econômica Federal na remuneração de sua rede parceira, os Correspondentes Caixa Aqui (CCAs), reacendeu um debate sensível no setor habitacional brasileiro. O tema envolve não apenas os correspondentes, mas também imobiliárias, corretores, construtoras e pode afetar diretamente a velocidade de contratação do crédito imobiliário no país.
De acordo com manifestações recentes da ANCCA (Associação Nacional de Correspondentes Caixa Aqui), a Caixa comunicou a adoção de um “Novo Modelo de Remuneração da Rede Parceira – Habitação”, com implementação prevista para 2 de janeiro de 2026. A entidade afirma que a proposta representa uma ruptura de previsibilidade e do equilíbrio econômico-financeiro, além de gerar insegurança jurídica para as empresas que integram a rede.
Diante disso, a ANCCA solicita a suspensão imediata da implementação e a revisão integral do modelo, com a criação de um grupo técnico envolvendo a Caixa, o Conselho Curador do FGTS, a própria ANCCA e a Febralot.

Repercussão no mercado imobiliário
O tema também ganhou repercussão entre profissionais do setor. Em vídeos divulgados ao público, o especialista em financiamento imobiliário Murilo Arjona defendeu que a discussão precisa ser ampla, pois impacta “todo o ecossistema”, incluindo incorporadoras, imobiliárias, corretores, correspondentes e o próprio banco.
Segundo ele, a remuneração dos correspondentes não é reajustada desde 2015 e, com o novo modelo, haveria uma redução relevante, estimada em cerca de 20% na remuneração ligada ao SBPE, conforme sua avaliação.
Redução de receita e metas
A ANCCA explica que o modelo atual tem como referência uma remuneração de 1,20%, condicionada ao cumprimento de metas semestrais. Pelo novo desenho apresentado, esse percentual deixaria de existir já em janeiro de 2026, inclusive para correspondentes que cumpriram as metas até dezembro de 2025.
A associação estima que a nova tabela poderá gerar uma redução da receita bruta entre 16,67% e 33,33%, além de manter tetos financeiros congelados desde fevereiro de 2015, o que ampliaria a defasagem do modelo.
Papel dos correspondentes na política habitacional
A ANCCA ressalta que a rede de correspondentes é peça-chave na execução da política habitacional no país. Segundo a entidade, os CCAs estão presentes em 2.078 municípios e respondem por mais de 90% da produção habitacional nacional.
Entre janeiro e julho de 2025, a rede teria sido responsável pela originação de R$ 55 bilhões em Habitação FGTS, R$ 23 bilhões em Habitação SBPE, além de operações de consignado, consórcio e seguridade, totalizando R$ 81,86 bilhões no período.
Custos operacionais em alta
Outro ponto levantado é o aumento expressivo dos custos operacionais entre 2015 e 2025. A ANCCA estima um crescimento médio de 91,2%, influenciado por fatores como IPCA acumulado, reajustes do salário mínimo, aluguéis comerciais, energia elétrica, telecomunicações, combustíveis e custos de tecnologia da informação.
Segundo a entidade, o congelamento de tetos e percentuais por mais de uma década agravou a defasagem do modelo de remuneração atual.
Possíveis impactos sistêmicos
A associação alerta que a implementação do novo modelo sem ajustes pode gerar impactos sistêmicos, como fechamento de empresas, perda de capilaridade em regiões sem agências da Caixa, aumento nos prazos de atendimento, queda na qualidade dos serviços e reflexos diretos na contratação de programas habitacionais.
Embora afirme não ser contrária a critérios de desempenho, a ANCCA critica o que chama de “abismo entre faixas”, destacando que os volumes de contratação variam conforme condições regionais, como renda média, densidade populacional, oferta de empreendimentos e dinâmica econômica local. A entidade defende um período de transição e a realização de estudos de impacto antes de qualquer mudança estrutural.
Apoio de entidades do setor
O posicionamento da ANCCA conta com o apoio de importantes entidades do setor, como a CBIC (Câmara Brasileira da Indústria da Construção), o COFECI (Conselho Federal de Corretores de Imóveis) e o FNNIC (Fórum Norte e Nordeste da Construção Civil). O apoio reforça que a preocupação vai além dos correspondentes e envolve toda a cadeia da habitação.
O debate deve se intensificar nos próximos dias. De um lado, está a busca por eficiência e sustentabilidade do modelo; do outro, a necessidade de preservar capilaridade, ritmo de contratações e acesso ao crédito imobiliário, fundamentais para atender à demanda habitacional no país. O pedido central do setor é que a discussão seja conduzida de forma técnica, transparente e colaborativa, com equilíbrio para todos os elos da cadeia.






